"♫Cristo falou comigo no toque do berimbau ♪"

                                                   música e poesia

 

Para falar de música e poesia da capoeira é interessante nos reportarmos ao Trovadorismo para entender seus fundamentos .

Trovadorismo é a primeira manifestação literária da língua portuguesa. Seu surgimento ocorreu no mesmo período em que Portugal começou a despontar como nação independente, no século XII; porém, as suas origens deram-se na Occitânia, de onde se espalhou por praticamente toda a Europa. Apesar disso, a lírica medieval galaico-português possuiu características próprias, uma grande produtividade e um número considerável de autores conservados.

 

 

 

São admitidas quatro teses fundamentais para explicar a origem dessa poesia: a tese arábica, que considera a cultura arábica como sua velha raiz; a tese folclórica, que a julga criada pelo próprio povo; a tese médio-latinista, segundo a qual essa poesia teria origem na literatura latina produzida durante a Idade Média; e, por fim, a tese litúrgica, que a considera fruto da poesia litúrgico-cristã elaborada na mesma época. Todavia, nenhuma das teses citadas é suficiente em si mesma, deixando-nos na posição de aceitá-las conjuntamente, a fim de melhor abarcar os aspectos constantes dessa poesia.

A mais antiga manifestação literária galaico-portuguesa que se pode datar é a cantiga "Ora faz host'o senhor de Navarra", do trovador português João Soares de Paiva ou João Soares de Pávia, composta provavelmente por volta do ano 1200. Por essa cantiga ser a mais antiga datável (por conter dados históricos precisos), convém datar daí o início do Lírica medieval galego-portuguesa (e não, como se supunha, a partir da "Cantiga de Guarvaia", composta por Paio Soares de Taveirós, cuja data de composição é impossível de apurar com exactidão, mas que, tendo em conta os dados biográficos do seu autor, é certamente bastante posterior). Este texto também é chamado de "Cantiga da Ribeirinha" por ter sido dedicada à Dona Maria Paes Ribeiro, a ribeirinha. De 1200, a Lírica galego-portuguesa se estende até meados do século XIV, sendo usual referir como termo o ano de 1350, data do testamento do Conde D. Pedro, Conde de Barcelos|D. Pedro de Barcelos, filho primogênito bastardo de D. Dinis, ele próprio trovador e provável compilador das cantigas (no testamento, D. Pedro lega um "Livro das Cantigas" a seu sobrinho, D.Afonso XI de Castela).

Trovadores eram aqueles que compunham as poesias e as melodias que as acompanhavam, e cantigas são as poesias cantadas. A designação "trovador" aplicava-se aos autores de origem nobre, sendo que os autores de origem vilã tinham o nome de jogral, termo que designava igualmente o seu estatuto de profissional (em contraste com o trovador). Ainda que seja coerente a afirmação de que quem tocava e cantava as poesias eram os jograis, é muito possível que a maioria dos trovadores interpretasse igualmente as suas próprias composições.

A mentalidade da época baseada no teocentrismo serviu como base para a estrutura da cantiga de amigo, em que o amor espiritual e inatingível é retratado.As cantigas, primeiramente destinadas ao canto, foram depois manuscritas em cadernos de apontamentos, que mais tarde foram postas em coletâneas de canções chamadas Cancioneiros (livros que reuniam grande número de trovas). São conhecidos três Cancioneiros galego-portugueses: o "Cancioneiro da Ajuda", o "Cancioneiro da Biblioteca Nacional de Lisboa" (Colocci-Brancutti) e o "Cancioneiro da Vaticana". Além disso, há um quarto livro de cantigas dedicadas à Virgem Maria pelo rei Afonso X de Leão e Castela, O Sábio. Surgiram também os textos em prosa de cronistas como Rui de Pina, Fernão Lopes e Gomes Eanes de Zurara e as novelas de cavalaria, como a demanda do Santo Graal.

 

CLASSIFICAÇÃO DAS CANTIGAS

 

Com base na maioria das cantigas reunidas nos cancioneiros, podemos classificá-las da seguinte forma:

Gênero lírico
Gênero satírico

...A musicalidade na capoeira serviu e serve para estabelecer a comunicação entre
os capoeiristas e as forças emanantes, assegurando a transmissão oral como caminho de
interlocução da história, que favorece a preservação dos seus ritos de passagens.
A poesia sonora e a produção de saberes na musicalidade da capoeira
A música na capoeira é como uma poesia da vida real, que tece acontecimentos diários,
onde identificamos diversos elementos entrecruzados das línguas portuguesas, africanas e
indígenas, marcando a sua presença no mundo com seus códigos e significados, dessa
maneira, podemos considerar a música da capoeira uma poesia sonora que segundo Enerst
Robson considera:
A música fonética pode ser facilmente concebida como um âmbito particular da
poesia sonora. É poesia sonora toda forma acústica da linguagem que seja
independente da gramática ou do significado. Ela pode ser acompanhada ou não,
acusticamente, de um texto significante, de música instrumental ou de efeitos
ambientais 1.
Nas chulas, corridos ou quadras da capoeira verificamos a poesia sonora onde,
geralmente, tem um significado implícito e sempre está acompanhada dos instrumentos e sons
ambientais, já que as rodas aconteciam nos espaços públicos (as ruas) até o inicio do século
passado. A poesia sonora na capoeira fala sobre acontecimentos reais da história de sofrimento
vivido pelos negros. Dispositivos utilizados por eles para gritar contra as injustiças e para falar
dos episódios ocorridos durante as contendas e das próprias festas populares. Criadas pelos
próprios capoeiristas, sem compromisso de obedecer às regras gramaticais da língua
portuguesa. Essa poesia-música do povo da rua servia para liberar suas angústias enfrentadas
na sua labuta diária.
Estamos considerando as canções da capoeira como uma prática enunciativa,
dialógica, polissêmica e polirítmica, oriunda, sempre de entre- lugares, negociação e conflito
permanente, fortalecendo os contatos culturais africano, indígena e português. Sabemos que as
relações étnicas e sociais no Brasil foram de dominação, de confronto e resistência, e também
de interação, aliança e compromisso entre diversos setores da sociedade. Durante 500 anos de
convivência, as formas musicais se misturaram, inclusive de modo polêmico, do mesmo modo
que interferiram as relações culturais, sem que nunca se deixe de lado a questão das forças
motrizes do devir estético e social.
Segundo Emília Biancardi, “As letras das músicas da capoeira retratam, por vezes,
fatos históricos...2”. Esta é uma forma de relembrar o sofrimento vivido pelos antepassados
homenageando-o pela sua bravura e devoção. Não se refere apenas à luta pela liberdade, mas
também por provocações (cantigas de sotaque) que podiam surgir a qualquer momento e
quando aparecia um valentão querendo sempre disputar os espaços tentando instituir o seu
poder, eles catavam:


Quebra gereba, quebra gereba; Quebra tudo hoje amanhã nada quebra, Quebra,
quebra gereba; Quebra tudo amanhã quem te quebra, Quebra, quebra gereba...

 

As cantigas de desafios geram intrigas. Os capoeiristas guardam mágoas de brigas
passadas e esperam a oportunidade certa para tirar a sua forra. A música, “quebra jereba,” já é
conhecida dentro das rodas de capoeira como música de desafio. Ao ser cantada, a mesma se
caracteriza por um jogo rápido, onde os capoeiristas trocam golpes para ver quem vai sair
“quebrados”. Ao cantarem “você quebra hoje, amanha quem te quebra?”, eles fazem alusão à
paciência que o capoeira deve ter para disputar o golpe na hora certa. É um aviso de que a
“luta” não vai ser esquecida. Rego considera que os “sotaques advertindo, sob várias maneiras
às pessoas, que não se envolvam onde não podem, sobretudo mostrando que o tamanho e a
força não funcionam muito valendo apenas a inteligência, a habilidade”.

 

Na capoeira, a música se funde formando a arte da multiplicidade sonora, formatando a
“poesia musicada”, desta forma, o capoeirista faz de sua música uma potência-poética vivida
e re-atualizada por todos aqueles que estão na roda. A roda lócus da produção material e
imaterial possui o poder de traçar linhas de fugas impossíveis de serem totalmente capturadas
e o devir dos corpos batucando criam novos poemas com novos ritmos.
Os produtores culturais na roda de capoeira utilizam-se de chiados e outros fonemas
lingüísticos formando distintas sonoridades daquelas convencionais. Podemos citar como
exemplo, a seguinte música: “Eu pisei na folha seca, vi fazer chuê chuá, chuê chuê chuê
chuá , eu vi fazer chuê chuá...” O chuê chuá complementa a música, exercendo função
equivalente ao som de pisar na folha seca. Para essa expressão de complemento poético,
Fortunato Depero utiliza a onomalíngua que “são expressões derivadas da onomatopéia... Quis
precisamente interpretar a linguagem abstrata das forças naturais, como o vento, chuva, do
mar, do rio, do fogo, de todas as emoções e sensações íntimas5”.
Outro exemplo presente nas canções da capoeira é a onomatopéica representada pelo
choro da criança: “Chora minino; nhem, nhem, nhem; o minino é chorão; nhem, nhem,
nhem...” onde o nhem, nhem, nhem é a representação sonora do choro da criança...

                                                                                                              (Trecho de manografia de Maria Eduarda L. da S. Pessoa)

 

 

 

 

 

 

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